Parte 3

Quando ganhei o cd do U2 nos meus 14 anos, muita coisa mudou em mim. Primeiro que começou um sangue escorrer mensalmente de minhas pernas. Descobri que ser protegida do Juliana não era um bom negócio, porque ela já estava começando a querer ser Kevin Costner e me fazer de Whitney. E eu fui Whitney. Mas isso conto já já.

Foi na primavera, não lembro exatamente o dia que eu decidi ser uma menina normal. Estava cansada de ser bruxa, e usar uma bolachita de escudo. Então com uma coragem que não imaginava que havia em mim, resolvi ir num sarau.

Fui tão bem vestida! Um camiseta que Ronaldo Gordo usaria hoje. Na estampa, Che Guevara.  A calça jeans, um mim, daquelas com o cós aparando as tetas, que cresceram tudo que são hoje em um dia. Ou seja, só cresceram aquele pouquinho, aquele dia. E um tênis Regazone preto-e-branco, que deveria pesar uns 4 quilos. O cabelo amarrado como o da Mel C.

Fui sozinha, eu não tinha amigas. Entrei e não sabia dançar absolutamente nada! O que fiz? Peguei uma mirinda laranja, e me sentei num canto e lá fiquei. Como o tempo às vezes é cruel! Gente não passava, e não passava. E as gurias todas bonitas com seus jeans coloridos, rosas, laranjas, e verdes. Foi moda na época. E eu que parecia uma assistente de palco do Nirvana. Só faltou eu importunar o sarau gritando: Toca Raul!

Mas eis que quando me levanto para ir embora. Entra uns garotos que iam tocar. Uma dessas bandas de garagem. Só me chamou a atenção o bateirista. Meus pensamentos chamaram ele de Bateirista. Os braços desenhados, uma tatuagem de caveira de presidiário no ombro esquerdo. Um cabelo mal cortado, mal penteado e sujo. E usava um tênis Regazone igual o meu.

Senti falta do Juliana. Pediria para ela surrar todas aquelas gurias bonitas, maquiadas e boas dançarinas que chamavam a atenção dele. Que ódio. Gente, como que ele, o homem da minha poderia olhar mais para elas? O que havia de errado em mim? Só porque eu parecia um menino gay?

Mas tudo mudaria. Quando eles começaram tocar, resolveram fazer um cover do David Bowie! Gol para mim! Eu sabia cantar. Saí do armário! Fui lá na frente do palco, cantei e dei gritinhos feito uma fã da Sandyjúnior. E óbvio, não desgrudei os olhares dele. 

O show terminou e eu tirei uma coragem de dentro do fígado e fui lá, dizer que adorei o show. Mas não conversei com todos. Para mim foi um solo de bateria. Eliéser era o nome. Conversamos um pouco e combinamos de nos falar pelo 138 de noite! Eu disse que entraria como Fada Violeta, afinal eu já não podia ser uma bruxa. Ele seria, o Fantasma. Amanheci pendurada no telefone aquela noite. 

Na segunda-feira seguinte descobri o que era batom, saia, sandália. Eu vendi minha vaca de estimação que se chamava Setembrina. Gastei tudo em roupa, maquiagem. Comecei tomar banho todos os dias.

Comecei a beijar o Eliéser dia sim, e dia não! Mas quando chegou o final do ano ele se mudou. Foi para Santa Maria. E eu fiquei lá, mais uma vez perdida e deslocada. Chorei uma semana. Até me dar conta que, minha querida madrinha Aurora, também morava lá. Que vivia sozinha. E que dois meses depois eu começaria o segundo grau.

Então, porque não ir fazer o magistério em Santa Maria? Foi o que fiz. As chantagens que fiz para convencer meus pais, são tão vergonhosas que prefiro não falar. Sei que depois de muitas ameaças de suicídio, consegui com que me mandassem embora.

Eu lembro pouca coisa do primeiro ano do segundo grau. Eu não estudava. Um dia antes de qualquer prova, eu fazia uma cola e pronto. Minha vida era meu namorado. Era Eliéser. Que nome feio!

Mas foi aí que chegou um momento que sempre chega. O dia da primeira vez.

Sobre a primeira vez

Só para adiantar, odiei. Achei um pau duro a coisa mais feia que vi na vida. Mas poxa, eu precisava encarar isso. Me preparei psicologicamente, dois meses para isso. A base de muito chá de cogumelo que um amigo do Eliéser, o Tales Bufa-bufa me apresentou. Todo sábado a tarde eu tinha encontro marcado com Smurfs, vaquinhas coloridas e a tartaruga-branca. 

Só que a coisa foi se tornando inevitável. Fui passar um final de semana na casa de uma colega. Mentira. Isso era o que minha madrinha Aurora pensava. Eu me enfiei no apartamento do Eliéser, que ele dividia com dois caras. Que haviam se escafedido naquele final de semana. Bebi uma cerveja e fiquei doidona. Foi a primeira vez que bebi cerveja.

Enfim, quando eu vi estávamos ouvindo uma rádio AM, que era só que sintoizava no rádio velho. E beijo vai, beijo vem. Ele ficou nu. E eu idiota. Nossa eu agi feito uma idiota! Um grande idiota. quando vi aquela coisa saido da cueca, fiz uma cara de dois-pontos-o. E corri pro banheiro, me chaviei, e para completar o fiasco, comecei a chorar.

Restou a ele uma hora de longa batalha verbal para me convencer a abrir a porta. Ele conseguiu, me pegou no colo. Mas fiasco pouco é bobagem. Eis que na rádio AM, toca as Marcianas. 

♪ Vou te amarrar na minha cama, só para fazer amor comigo...♪

Mais choro, mais papo, e finalmente um baseado. Daí tudo mudou. Achei engraçado transar. Nem senti dor. Descobri o sexo, a maconha, a cerveja, e um cigarrinho depois, na mesma noite. 

3 comentários:

Caroline disse...

Nunca vi uma narração de primeira vez tão divertida.

Adoro ocê, Viola.

Gil disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Gil disse...

Enrolou os pais, a dinda Aurora e foi chorar no banheiro do bateirista. Nada que um bom chá de cogumelo não resolva!

Minha, tá matando a pau! Não me faça esperar muito pela parte 4.