Parte 2

Sobre as flores

O que tenho para contar se torna interessante depois dos meus quinze anos. Porém, posso fazer uma relação paralela entre minha vida e as flores

Da violeta

Meu pai se chama José Antônio. Hoje ele tem 58 anos. Ele foi casado com uma mulher chamada Leonor que é a mãe dos meus três irmãos mais velhos. Quando eles se separaram, meu pai estava de partida para Napoli, onde faria o doutorado em Floricultura. Rômulo tinha apenas um ano. Lá ele conheceu minha mãe, que se chama Carmina, namoraram, noivaram e casaram. Três meses depois eu nasci. Dois anos depois eles tiveram um casal de gêmeos. Dizem que no dia um de abril de mil novecentos e oitenta e dois os corredores daquele hospital silenciaram. Nasci na primavera, a estação das flores.

Me chamo Violeta Benedita. Violeta por ser a flor preferida do meu pai, Benedita o nome escolhido pela minha mãe. Ela cheirava loló na época.

Três meses depois, ele, minha mãe e eu partimos para o Brasil. Enchi quatro fraldas na minha primeira viagem de avião. Fomos para a terra natal dele, Canela, no Rio Grande do Sul. Sou uma ítalo-brasileira, mas muito mais uma ítalo-gaúcha, bairrista e orgulhosa disso.

Lá ele usou o dinheiro que ganhou e mais o que herdou do meu avô, que eu nunca vi mais gordo, e fez uma plantação de rosas. Ele tem um roseiral.

Das rosas

Odeio rosas. Me cresci no meio delas, e para mim não passam de plantas espinhentas com um colorido de disfarce. Citação para eternidade: [/silver] Rosas são fakes. São espinhos doloridos disfarçados de romance. E não possuem função ecológica nenhuma.

Nunca tive interesse nelas. Eu gostava mesmo era de brigar todo o dia com alguém na escola. Surrei umas doze gurias, apanhei de umas sessenta. Não me esqueço do Juliana. Ele tinha pêlos, mas entrava na fila das meninas. Ele tinha 17 anos quando foi minha colega de sexta-série e ameaçou a professora Cledi, de Educação Física, de morte a* canivete, caso ela não namorasse com ele. Juliana tinha barba. E quando chamei ela de machona, o Juliana me deixou um olho roxo que durou duas semanas. Na terceira semana seguinte eu pedi desculpas, e até a oitava série eu tive um segurança particular.

Dos crisântenos


Entre os 426 passos da minha casa ao colégio havia um cemitério. E na divisa do cemitério com a escola havia uma tela com um furo. Era meu portal para meu mundinho, todo recreio. Antes mesmo da J.R. Rolling (a autora do Harry Potter)** pensar na bruxaria de Hogwarts, eu já praticava.

Eu pegava os crisântenos das coroas para fazer poções mágicas. Misturava com limo, tocos de velas e alguns caninos e molares. Meu caldeirão era uma panela de ferro usada para oferendas ao Nanaio, um anão famoso por lá.

Minhas poções tinham que ficar prontas em quinze minutos, porque antes da sineta tocar, eu precisava entrar escondida no banheiro do diretor. Era bom cagar lá, pois o acento era macio e o papel higiênico tinha cheirinho tão bom e com gravuras em alto-relevo tão bonitas que eu queria usar como papel de carta.

Toda essa minha relação com as flores, desde meu nascimento, possa ser a explicação de hoje,*** eu ser paisagista, casada com um D.J., que nas horas vagas toma conta da própria floricultura.

* não sei se vai crase.
** não me lembrei com é a escrita do nome dela
*** não sei se iria essa vírgula

2 comentários:

Anônimo disse...

(*acompanhando*)

Gil disse...

O teu diretor usava papel higiênico perfumado e com motivos florais? Eu também tive um diretor que era gay. Um dia ele me falou: "que chique esse All Star!".
Respondi: "é, bem diferente dos outros, né?". Ele sorriu amarelo e eu fiquei em recuperação.