O passado dos Lori

Os dias se passaram e nunca mais alguém ouviu falar sobre Guilhermina. O detetive Sérgio conversou com o chinês Xin Li Ping, que disse que Guilhermina saiu de sua casa após o programa e que depois daquilo nunca mais a viu também. Dificilmente alguém desacreditaria em alguma coisa que Xin Li Ping falasse. Sua expressão na grande maioria das vezes era de uma extrema simpatia!
A única pessoa que sentiria mesmo a ausência de Guilhermina seria sua irmã gêmea. Mas Brunette ainda não havia voltado do Brasil. Tão pouco chegara alguma carta dela. André Ravéras havia enviado um postal para Peter mostrando a exuberância da Baía de Guanabara, mas no postal nada constava sobre a volta deles.
Mas o lugar de Firenze onde mais havia um clima denso era na casa dos Lori. Giulian e Charlotte pouco iam lá, estavam muito ocupados com seu consultório novo. Peter também não visitava os avós com frequência, pois passava a maior parte do seu tempo vistiando Sadine. E Nhá Cleide, todo final de tarde ia tomar sorvete com Cisnério lá nas proximidades da Via Di Fiori.
O sr. Marco após descobrir o nascimento de sua filha, decidiu que faria o impossível para encontrá-la, já que Bruna, após deixar a filha na casa de Liènne nunca mais tomou conhecimento das duas. Carmela estava cada vez mais azeda. Nem usava mais seus tradicionais vestidos azuis. Vestia-se agora num cinza escuro, quase como se estivesse de luto. Talvez por parecer bastante distante, ela nem questiounou muito quando o sr. Marco comunicou que iria até Paris. Usou como pretesto a companhia do seu amigo Cisnério, disse que o acompanharia, pois Cisnério precisava resolver questões de herança e testamento, e sentia-se velho demais para viajar sozinho.
No dia seguinte a partida de sr. Marco, dona Carmela decidiu que iria até a igreja. Levantou cedo, pretendia ir e voltar antes mesmo do almoço.
Ao chegar na igreja do padre Aleto, sra. Lori dirigiu-se diretamente ao confissionário.
- Padre, venho aqui porque preciso confessar-me.
- Em nome de Deus estou aqui para ouvir-te minha filha.
- Eu não sei como começar a falar. Trata-se de algo que eu deveria ter confessado a muito tempo. Mas nunca tive a coragem de revelar isso. É algo tão terrível que me consome a mais de trinta anos. Com o tempo eu me acostumei viver com esse arrependimento. Mas depois que ele partiu, essa culpa voltou a me atormentar.
- Quem partiu senhora?
- O sr. Martino. Há trinta anos atrás eu cometi o pecado mais abominável que uma mulher decente pode cometer. Eu fui infiel. Durante quase um ano eu tive um caso com o sr. Martino. Mas parece que agora, fatos do passado voltaram para me assombrar. Eu sempre soube da traição de Marco. E considerei que isso seria minha punição pelo caso que tive. Mas esse ano, primeiro o sr. Martino morre tragicamente. E agora eis que volta para cá essa tal Bruna. Ela fora a amante de meu marido.
- Seu pecado é muito grave senhora! Creio que apenas através de um sincero arrependimento, Deus possa lhe perdoar.
- Pois estou extremamente arrependida. E se hoje eu não obtiver o perdão. Não conseguirei viver mais. Não terei mais um dia de alegria nessa vida. Terei essa sina, esse tormento comigo mesma.
- Sendo assim, Deus lhe perdoa! Peço a senhora que reze aqui o ato de contrição. Depois, vá diante do altar e reze um terço. E faça isso todos os dias antes de dormir.
Dona Carmela Lori rezou o ato de contrição, o terço, e assim aos olhos de Deus foi perdoada. Semanas depois viu-se ela usando vestido azul novamente.
***
Foi mais ou menos durante esses dias que Emilieva perdeu a criança que estava esperando. Ela e Lucius lamentaram a perda por alguns dias. Mas passado esse breve luto, Emilieva passou a repensar sua vida. Sentia-se feliz, por dormir apenas com Lucius que sempre foi muito carinhoso com ela. Porém a vida de mulher de leiteiro, vivendo em condições bastante precárias, tendo que ajudar na ordenha das vacas, não a contentava. Além de tudo, ficar dependendo de caridade, longe dos vinhos, uísques, e cama confortável.
A sua decisão em continuar ali ou não foi influenciada na última visita de Emanuelle.
- Amiga!!! Quanto tempo, entre, e sinta-se bem-vinda aqui, nessa casa!
- Quando Van Göethe me contou que tu havias perdido seu filho eu quis vir imediatamente, Emilieva! Porém estou bastante aterafada cuidando tudo lá no salão! Peço que me desculpe por não ter estado antes contigo, nessa hora tão difícil!
- Te desculpo sim, se não fosse por você não sei o que seria de mim. Não aguento mais ter esse cheiro de vaca! Eu não mereço isso.
- É verdade. Mas agora estás casada!
- Moro junto com Lucius. Ele é atencioso comigo, mas nunca me dará a vida que quero. Mas esqueça meus problemas. Me fale de você! Como tem passado?
- Andei muito triste. Soube que Peter vai casar-se com a tal Sadine! Como tenho raiva dela! Mas ando tendo encontros com Tulio Munari, sabe, o dono do Cassino. Ele é um homem muito bonito também, e serve como distração. Talvez eu consiga esquecer Peter. Eu nunca deveria ter criado tal ilusão, fui muito tola.
- Ah...realmente, eu considero Tulio muito mais interessante. Mas fazer o que não mandamos no coração. E Madame Filipa como está?
- Está do memso jeito, não piorou, mas tão pouco melhorou! E com a ida de Brunette para o Brasil e o sumiço de Guilhermina, tudo tem ficado mais difícil. Temos faturado pouco. E a clientela diminuiu.
- Eu soube que aquela nojenta sumiu. Não fará falta.
- Para o faturamento do salão faz! Preciso encontrar duas novas garotas pelo menos.
- Compreendo.
As duas conversaram a tarde toda, tomaram chá e comeram um delicioso bolo de cenoura que Emilieva fez. Mas antes do entardecer, Emanuelle partiu para abrir o salão.
Naquela noite, o salão de Madame Filipa estava com o movimento bastante calmo, o que era péssimo, e fazia com que Emanuelle se obrigasse a atender alguns clientes para poder dar conta das despesas do lugar. Porém, uma visita inesperada surgiu. Emilieva entrou com suas malas.
- Eu acredito que estejam precisando de moças aqui?
- Emilia! Precisamos sim, você com certeza é uma grande aquisição. E na atual situação duvido que Madame Filipa se oponha. Mas e Lucius?
- Eu o larguei. Espero que ele compreenda! Eu não nasci para aquela vida. Preciso me sentir mais confortável. Mesmo que para isso eu precise voltar a me deitar com velhos gagas.
- Lamento que sua vida fora daqui não tenha sido a melhor. Mas se estás convicta de sua decisão, leve suas malas para seu quarto, o mesmo de tempos atrás. Continua do jeito que você deixou, nunca mais foi ocupado! E se estiver disposta a começar trabalhar ainda essa noite, eu agradeceria muito.
- Obrigada! Agradeço muito e conte comigo, em 10 minutos eu desço!
E nessa noite do mês de maio, Emilieva voltou a trabalhar na casa de Madame Filipa, sem nenhuma objeção. E as roseiras começaram a brotar novamente.
***
Atráves das informações dadas por Bruna, após alguns dias finalmente o sr. Marco e Cisnério encotraram a casa de Liènne em Paris.
- Bom dia senhores. Em que posso ajudá-los?
- Bom dia senhora. Disse o sr. Cisnério. Viemos de Firenze, e esperamos que você nos ajude e muito.
- Viemos através de algumas informações dadas por uma senhora chamada Bruna Delalibera. Conhece?
- Bruna! Oh meu Deus nunca mais ouvi falar dela! Já se vão mais de 20 anos que não a vejo. Entrem senhores. Entrem, farei um café para nós! Meus Deus! Ao menos sei que Bruna continua viva, a pobre.
Após tomarem alguns goles de café o sr. Cisnério começou:
- Então, o que nos trouxe aqui é algo muito importante para o senhor Marco.
- Sim, eu conheci a sra. Bruna muito tempo atrás. E somente agora que nos reencontramos em Firenze ela me contou algo muito importante.
- Então ela voltou para lá, como ela vai?
- Sua amiga vai bem, sra. Liènne. Assumiu a tenda de carnes de seu primo Martino. Disse o sr. Cisnério.
- Mas o que importa, falou o senhor Marco, é que ela me reveleou que teve uma filha. E essa filha é minha também. Por isso queria que você me desse alguma informação sobre o paradeiro dela.
- Ah, santo Deus! Então você é o pai de Emanuelle. Sim, Emanuelle nasceu aqui mesmo nessa casa. Mas já tem algum tempo que não sei mais nada dela. Bruna mal pariu e foi-se embora para Genova, e nunca mais voltou. Eu criei Emanuelle até ela ter dezesseis anos. Foi aí que ela me abandonou. Foi muito ingrata comigo.
- E a senhora sabe para onde ela foi? Perguntou o sr. Cisnério.
- Qualquer informação será muito útil para eu encontrar minha filha. Ao menos saber do destino dela!
- Eu não sei se ajudará muito. Logo que ela saiu daqui andou pelas ruas. A última notícia dela que tive é que ela foi parar num bordel. Virou cocote.
- E a senhora saberia em que bordel ela foi trabalhar? Perguntou o sr. Marco.
- Eu a vi uma vez, saindo de um bordel. Se chamava La femme.
- Bom, então, meu amigo Marco, creio que esse seja o próximo passo.
- Sra. Liènne eu gostaria que aceitasse essa quantia em dinheiro. Não sei como lhe retribuir de outra forma no momento. A senhora foi bastante prestativa. E ficarei com seu endereço. Pretendo lhe gratificar ainda mais, por ter criado minha filha. Mas agora, devemos ir em busca desse bordel.
- Eu não recusarei a oferta, pois tenho uma vida muito simples como os senhores podem observar. E se souberem alguma notícia de Emanuelle ficaria ainda mais grata se me contassem.
- Assim faremos! Até mais ver sra. Liènne. Vamos Cisnério, temos muito o que caminhar, prtendo chegar nesse bordel hoje mesmo.
E assim os dois partiram. Na mesma noite chegaram no bordel que fora de Robes Pierre. Lá informaram que Emanuelle e sua amiga Emilieva haviam fugido após o assassinato do senhor Robes Pierre, e que a polícia local nunca soubera para que destino foram.
Frustrados os dois amigos trataram de voltar imediatamente para Firenze, sem esperanças alguma de um dia encontrarem a filha perdida. Mal sabiam eles que ela morava tão próximo, e que agora atendia pelo nome de Violeta. E que por sorte nunca havera se deitado com seu próprio pai no bordel de Madame Filipa.

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